quarta-feira, 4 de maio de 2011

III ACAMPAMENTO DA JUVENTUDE DA AGRICULTURA FAMILIAR Concórdia - SC, 27 a 29 de abril de 2011

RESOLUÇÃO FINAL: Juventude e Sucessão na Agricultura Familiar!

1. Queremos dizer quem somos

Nós somos, com o maior prazer, a juventude da FETRAF-SUL/CUT. Somos integrantes e a continuidade da mais rica tradição de lutas sociais do campo brasileiro, que perpassa os diversos e sucessivos movimentos sociais que ao longo da historia do Brasil lutaram por liberdade de organização social, pela democratização do país, por políticas de acesso à terra e reforma agrária, por distribuição de renda e de riquezas, por políticas públicas apropriadas e favoráveis aos trabalhadores do campo. Somos a continuidade daqueles lutadores sociais que ao longo do tempo sofreram perseguições, repressão, e até mesmo tombaram na luta, mas que enfrentaram os seus medos, os seus patrões, a repressão policial, e também o autoritarismo de Estado que por muito tempo esteve presente neste país e sufocou as liberdades e oprimiu trabalhadores e jovens estudantes que lutavam pelos seus ideais.

Nós somos integrantes da Central Única dos Trabalhadores – CUT -, a maior central do Brasil, que iniciou a sua trajetória política nos anos 80 e se mantem fiel à luta e a unidade dos trabalhadores, do campo e da cidade. A CUT, que somos construtores e parte, pertencimento que tanto nos orgulha. Somos, em especial, a FETRAF-SUL/CUT, descendente direta dos Rurais da CUT, que há tempos luta pela organização sindical livre e plural dos trabalhadores, que enfrenta a reação conservadora dos que se sentem acomodados nos aparatos sindicais tradicionais e temem o novo. Somos a FETRAF-SUL/CUT e suas partes, que a compõe e a fortalece, portanto, somos sindicatos, as associações, as cooperativas de produção, as cooperativas de crédito, a cooperativa de habitação, os grupos de produção, as turmas de educação e formação dos projetos, Terra Solidária, Consórcio Social da Juventude Rural e Projeto Mulheres.

Somos tudo isso ao mesmo tempo, o passado, o presente e o futuro. Nossa história nos moldou culturalmente, nos fez chegar até aqui e nos dá o sentido a razão da luta política. Com certeza, não seríamos nós mesmos se não fosse nossa história, nossas lutas, nossas lideranças, nossa base social, nossas bandeiras, nossos símbolos, e nosso programa político, que nos possibilitam sonhar de olhos bem abertos e trabalhar incansavelmente para a plena realização de nosso projeto de sociedade.

Somos juventude, temos essa energia que pulsa incessantemente em todo o ser jovem. Temos a disposição para o amor, para o prazer, para a solidariedade, para a liberdade, para a fraternidade, para a alegria de viver. Nesta fase das nossas vidas, queremos ser o que somos: juventude. E, queremos viver a nossa juventude e não ficar somente nos esperando pelo futuro e nos preparando para sermos adultos. Queremos viver o que é próprio dos jovens: as dúvidas, medos, contradições, decepções amorosas, frustrações cotidianas, aventuras e incertezas sobre o futuro, etc. Porem, somos, queremos ser, e vamos continuar sendo, agricultores familiares, esses trabalhadores do campo, corajosos e maravilhosos que com seu trabalho e suas mãos alimentam toda a população do nosso país. Somos a história, o presente e também o futuro de um dos segmentos mais importantes e estratégicos de nosso país: a agricultura familiar.

2. Queremos entender o mundo em que vivemos

Acreditamos que "Outro mundo é possível", tal qual nos sugere o lema do Fórum Social Mundial. Sabemos que o mundo em que vivemos sofre de vários males. Infelizmente, algumas poucas pessoas mais ricas têm mais riqueza que muitos países juntos. Há opulência, abundância e até desperdício em muitos lugares, porem, em torno de um bilhão passam fome todos os dias, não por faltar alimento no mundo, mas porque eles não terem o dinheiro, que lhes daria o acesso para comprá-los ou as condições de produzi-los. Vivemos em um planeta em que sua superfície é coberta por 71% de água, mas milhões não tem acesso à água potável para satisfazerem as suas necessidades básicas, milhares morrem anualmente por falta das condições de saneamento básico que possam preveni-los de doenças que um copo de água limpa e um prato de comida, resolveria o problema. Um mundo em que a medicina avançou como nunca antes, em conhecimentos e tecnologias que podem tornar a vida mais saudável e tranquila, porem o acesso a esta medicina depende de recursos financeiros que a maioria da população não dispõe, por isso padecem, sofrem e morrem nas enfermarias, ou mesmo antes de lá chegarem.

Vivemos em um planeta que a população mundial nos anos 60 testava em três bilhões de pessoas, e dentro de 40 anos, mais do que dobrou, e em 2011 este planeta atingiu sete bilhões de pessoas, o que deveria ter sido melhor planejado, o que não ocorre porque no capitalismo, predomina o individualismo, de cada um por si. Se os governos tivessem realizado políticas que limitassem a acumulação de riqueza e proporcionassem a distribuição da renda, o mundo seria diferente. Mas, infelizmente, não é. Nosso mundo está assim, populoso, injusto, desigual, perigo, onde poucos têm muito, e bilhões têm muito pouco ou quase nada. Por haver mais pessoas no planeta, vivemos mais próximas geograficamente, mas isto não significou a aproximação humana de forma fraterna e solidária, são milhões que vivem solitariamente, são milhões que sofrem das doenças da modernidade como depressão e estresses diários.

Vivemos em um mundo capitalista, que estimula o consumismo sem limites, que concentra as riquezas em poucos países, poucas regiões, poucas empresas e poucas famílias. Grupos que defendem seus interesses com todas os meios, inclusive armados, se necessário for. Vivemos em um planeta que no ano de 2010, os gastos militares mundiais somaram US$ 1,63 trilhão, mas este mesmo mundo continua inseguro e sem perspectivas de paz no curto prazo.

Segundo IBGE, em 2007, o Brasil tinha 49,8 milhões de jovens na faixa de 15 a 29 anos de idade, o que representava naquele momento, pouco mais de um quarto (26,5%) do total de 189 milhões de habitantes do país. Mas o preocupante é que para esse mesmo ano os as vítimas de homicídios na faixa de 15 a 29 anos de idade representaram 54,7% do total de homicídios, isso quer dizer que os jovens estão morrendo vítimas da violência.

Neste mundo, em que alguns vendem e milhões compram estes produtos anunciados em criativos comerciais de televisão e bonitas embalagens, mas dentro delas há o perigo e o risco para a saúde humana. Segundo a ANVISA, em 2004 o mercado de agrotóxicos no Brasil foi de US$ 4,5 bilhões, sendo comercializado 500 mil toneladas de produto. Brasil é o 2º maior consumidor de agrotóxicos, sendo que o primeiro é os Estados Unidos. No mundo o gasto com agrotóxicos no mesmo ano foi de US$ 33,6 bilhões para um consumo de 3,5 milhões de toneladas. Estes produtos não vão para outro lugar, entram nas casas das famílias todos os dias. Bom seria, se todos tivéssemos consciência de que a doença e o risco podem chegar em bonitas embalagens.

Vivemos em um Brasil que cresce. A população do país em 1940 era de 41 milhões de habitantes, já em 2010 era de 192 milhões de habitantes, ou seja, em 70 anos aumentou 150 milhões de pessoas. Segundo dados do PNAD 2008 o Brasil tinha 83,75% urbana, e 16,25% rural. O país, portanto, aumentou sua população total, mas concentrou-a nas cidades. As famílias trabalhadoras do campo continuam com a responsabilidade de alimentar a todos, o que coloca para o governo e para toda a sociedade a importância estratégica da agricultura familiar.

Nosso país tem uma população sofrida, pois foi historicamente governado por elites que desprezaram seu povo. Como resultado disso, quando se comemorou os 500 anos, o país mantinha altos índices de desemprego e de pessoas que estavam na miséria. Foi a liderança do operário Lula, que ao chegar ao poder, começou uma revolução democrática, priorizando a luta contra a fome, contra a condição miserável do povo brasileiro. Nos últimos anos, o Brasil mudou e passou a criar mais oportunidades para todos. O governo do presidente Lula foi um marco das políticas sociais de distribuição de renda, alem disso fez altos investimentos em educação visando resgatar a enorme dívida social, e ao mesmo tempo, preparar o país para o futuro, fazendo, por exemplo, a universidade pública dobrar o número de vagas, criando o ProUni que dá oportunidades de acesso à universidade, também expandiu-se a rede de escolas técnicas federais.

Muito foi feito, mas, ainda há muito para ser realizado, o país ainda tem injustiças sociais, tem gente da miséria, tem carências no meio urbano e no meio rural. Portanto, a luta por um país melhor, para todos os brasileiros e brasileiras, ainda continua. É preciso construir um Brasil sem miséria e sem pobreza, com moradia digna, transporte, lazer, escola pública de qualidade para todos, segurança e direitos respeitados. É preciso radicalizar a democracia, o povo permear os meios de comunicação, a justiça e os governos. Ainda há muito por fazer. O nosso mundo e o nosso país precisam da juventude para as mudanças que são necessárias. É atual, é urgente, é preciso lutar contra a injustiça e desigualdade social.

3. Queremos construir o nosso futuro

Acreditamos que para se construir com solidez o futuro é necessário conhecer e entender a própria história. O futuro não é algo dado ao acaso, se constrói. Ao analisarmos o desenvolvimento do nosso país e da agricultura nas últimas décadas nota-se que houve profundas mudanças, sejam estas nas relações sociais, na forma de se produzir, no padrão de consumo e mesmo nos tipos de alimentos consumidos. É preciso reconhecer que muitas mudanças foram importantes e melhorias ocorreram nas condições de vida das pessoas do campo, tornando o trabalho menos penoso, conectando e aproximando o rural ao urbano. Com toda a certeza, sempre que as mudanças forem positivas, devem ser comemoradas, entretanto, muitas alterações no meio rural, se deram negativamente, pela força do modelo produtivo adotado e imposto, trazendo consequências e impactos, seja na vida familiar, na saúde das pessoas, na degradação do meio ambiente, bem como impactos sociais e econômicos, como, por exemplo, esvaziamento das comunidades rurais, empobrecimento e endividamentos das famílias, aumento dos riscos da atividade agrícola e excessiva dependência.

Precisamos entender que muitas coisas poderiam ter sido diferentes se o modelo agrícola do país fosse outro, ou se agricultura familiar tivesse tido apoio e políticas adequadas há muito tempo atrás. Foi somente no governo do presidente Lula que muitas políticas foram criadas e outras algumas aperfeiçoadas, mais abrangentes e adequadas à realidade da agricultura familiar, como por exemplo, são as linhas de crédito do Pronaf, o PAA, a alimentação escolar, o seguro da agricultura familiar, garantias de preços de alguns produtos, assistência técnica, entre outras.

O modelo agrícola que predomina atualmente é baseado na lógica do risco e da exclusão, ou seja, maior produção com menor número de agricultores trabalhando no campo. A suinocultura no Rio Grande do Sul, por exemplo, eram 60 mil suinocultores em 1996, já em 2009 eram apenas oito mil. Da mesma foram em Santa Catarina, na metade dos anos 80 havia mais de 65 mil suinocultores, mas em 1995 tinha 20 mil, e em 2010 eram cerca de 11 mil. Este é um modelo produtivo que exclui permanentemente concentrando a produção em cada vez menos propriedades, que verticalizam e fazem pesados investimentos em uma espiral de querer crescer e crescer, tornando-se grande, ultra especializado e com uma atividade de alto risco, em um mundo de mercados globalizados, que onde um país suspende a importação, ou uma guerra ou crise sanitária ou econômica desorganiza o todo e causa quebras e falências, muitas vezes generalizadas.

Na produção de leite, que é base e atividade estratégica da agricultura familiar, se repete o modelo excludente e concentrador. Segundo o último Censo do IBGE, houve redução de 25,91% no número de estabelecimentos no Brasil. Na Região Sul do Brasil, por exemplo, a redução foi de 31,93%. Em 1996 tinha 605.679 estabelecimentos, já em 2006 tinha 412.281. Neste mesmo período a mesma Região Sul apresentou um crescimento de 51,58% na produção, passando de 4,11 bilhões para 6,23 bilhões de litros de leite produzidos. Diminuíram-se os estabelecimentos produtores, mas a produção total aumentou, trazendo como resultado a concentração, que tende a crescer, pois muitas empresas passaram a atuar nessa lógica. Para existir um futuro para a agricultura familiar é preciso rejeitar essa lógica e construir outro modelo agrícola, que seja oposto a isso tudo.

Constantemente nos é apresentado novidades como se fossem a salvação para a agricultura brasileira, como é o caso dos agrocombustíveis, que em 2008 o país tinha 370 usinas funcionando, mais 43 em construção, com sete milhões de hectares de cana, com a demanda crescendo se está projetado que o Brasil vai triplicar as exportações de álcool em cinco anos. O significado disso é mais terras com monocultivos agrícolas, menos terras produzindo para abastecer a população, podendo encarecer os alimentos e tornar a vida dos trabalhadores urbanos mais sofridos e dificultar o combate a miséria no Brasil e no mundo. É o aprofundamento de um sistema perverso, concentrador e excludente, que traz consequências sérias para o meio ambiente, para as comunidades rurais e para os trabalhadores.

Mas nós somos jovens e queremos construir um mundo melhor para todos! Queremos que o nosso país se desenvolva social, econômica e culturalmente, ao mesmo tempo distribua riquezas e renda para seu povo. Queremos a democracia e o desenvolvimento ecologicamente sustentável, onde os usos dos recursos naturais possam satisfazer as necessidades das nossas gerações, mas sem comprometer o futuro, ou seja, que as próximas gerações tenham as mesmas condições de terem as suas necessidades atendidas. Se não for assim, para nós não será desenvolvimento, pois a nossa herança para nossos filhos e netos não deve ser um ambiente degradado, nem um mundo injusto, inseguro, empobrecido e poluído.

Queremos um desenvolvimento sustentável que incorpore as dimensões do tempo, do respeito aos ciclos da natureza, do compromisso com as próximas gerações, do respeito às culturas e aos povos, da justiça social e econômica, da democracia participativa, do controle social. É profundamente equivocado pensar que desenvolvimento se resume em bens materiais e no imediato, muito pelo contrário, desenvolvimento é um mundo onde as pessoas de hoje e do amanhã estejam como prioridade, assim temos o dever de construir uma sociedade mais justa e fraterna, que inclua a todos e promova direitos.

Nós somos jovens e queremos uma agricultura ecologicamente sustentável, pois este modelo agrícola químico e convencional se mostra a cada dia sem condições de responder aos desafios da sociedade, muito menos atender as necessidades da agricultura familiar. Queremos um modelo agrícola que não seja excludente, nem concentrador de riqueza em pessoas ou em regiões. Para atingir esse objetivo prosseguiremos com as bandeiras que nossas lideranças, nossas famílias, nossas organizações de base e nossa Federação há muitos anos lutam por ampliação de direitos, por políticas públicas e por um novo modelo produtivo. Este novo modelo sustentável e solidário deve ser construído pelos próprios trabalhadores, homens e mulheres, organizados em grupos, sindicatos, associações, cooperativas, agroindústrias, redes de cooperação, nos encontros e do dia a dia das famílias.

Acreditamos que o desenvolvimento rural deve ter na agroecologia a base para pensar um novo padrão produtivo, que não seja impactante para o meio ambiente, nem para as pessoas que trabalham no campo, nem para os consumidores. A agroecologia é um movimento social e político que luta pela construção de uma agricultura sustentável de base ecológica, ao mesmo tempo, luta para organizar as famílias para criar forma de cooperação que ajudem viabilizar economicamente as propriedades. É a construção social de uma alternativa a agricultura convencional, com características ecológicas e sociais. A agroecologia é a prática produtiva de uma agricultura que se propõe a aprender com o funcionamento dos ecossistemas, respeitando os ciclos da natureza e fazendo o manejo sustentável dos recursos naturais. Uma agricultura que se utiliza dos conhecimentos populares tradicionais e dos conhecimentos científicos de forma associada e articulada como base para a construção de estratégias de sistema agrícolas limpos, seguros, estáveis e produtivos.

Somos a juventude da agricultura familiar e queremos fazer história, continuar a ação e o movimento dos trabalhadores por melhores condições econômicas, por direitos, por vida digna, por políticas públicas adequadas as realidades sociais, por uma sociedade fraterna e solidária. A sociedade humana faz a sua história. E nós, juventude da agricultura familiar queremos fazer, conscientemente, a nossa história. Com nossa ação, queremos contribuir para melhorar as nossas vidas, da nossa comunidade e do nosso país, e com cada grupo fazendo uma parte, o mundo todo se tornará melhor para todos.

4. QUEREMOS DEFENDER NOSSAS PROPOSTAS DE POLÍTICAS PARA A JUVENTUDE DA AGRICULTURA FAMILIAR

4.1 QUEREMOS UM RURAL COM GENTE, COM SUCESSÃO DAS PROPRIEDADES

Para conter o êxodo rural, estimular a permanência da juventude no meio rural é necessário se criar várias formas de apoio a juventude, seja na aquisição de terras, na habitação, na produção e na industrialização. Mas alem disso é preciso valorizar a cultura e o modo de vida rural e o próprio espaço, valorização da atividade agrícola e da não-agrícola, onde ambas se complementam e constroem o mundo rural com suas especificidades culturais.

A população rural, em especial a juventude, deve ter direitos garantidos e acesso às políticas, aos bens culturais e serviços, da mesma forma que a população urbana. Neste sentido, a educação, o lazer, a cultura, inclusão digital, a qualidade da energia elétrica, transporte, telefonia de qualidade, segurança pública, dentre outros aspectos da vida não ligados a produção devem ser considerados e objeto de política pública e pauta dos movimentos sociais.

Propomos a criação de uma bolsa de apoio para jovens que permanecem no campo, em um primeiro momento de sua vida profissional como estímulo a dedicação em uma atividade ou como complemento de renda por tempo determinado. Seria semelhante ao primeiro emprego urbano, mas com características não de emprego, mas de apoio ao empreendedorismo do jovem rural.

A sucessão das propriedades familiares, a diminuição do êxodo rural e o fortalecimento da agricultura familiar devem ser luta de toda a sociedade, das lideranças sociais, agentes públicos e dos governantes de todas as esferas. O futuro das comunidades rurais e dos pequenos municípios, da ocupação do espaço, e da própria cultura, estarão em risco, se não diminuir o alto índice de evasão do campo. Para alterar esse quadro é necessário políticas públicas de amplo alcance e a presença do Estado, inclusive, conferindo à agricultura familiar o reconhecimento de interesse social, por ser estratégica para o país, com apoio e condição especial nas políticas publicas, como é o caso, por exemplo, da já existente lei da alimentação escolar e da proposta que esteja também no Código Florestal. A agricultura familiar, definida na lei 11.326/06, é diferente da grande propriedade patronal e deve ter tratamento diferenciado e favorecido com subsídios. Nessa perspectiva o governo federal deve ter uma política especial multissetorial que focasse na sucessão das propriedades.

A Política Nacional da Juventude, do governo federal, deve ter programa para a juventude da agricultura familiar, uma política com múltiplas ações de educação, saúde e prevenção de violência, geração de renda, acesso à terra, inclusão cultural. Estas ações devem ser articuladas e transversais em todo o governo.

4.2 POLÍTICAS DE ACESSO À TERRA

Para continuar na agricultura a juventude da agricultura familiar precisa de políticas que lhes garantam o acesso à terra e as condições para viver bem e produzir de forma tranquila. Para isso o Estado precisa oferecer um conjunto de políticas públicas, a começar pelo essencial, que é o acesso à terra para plantar. Assim é necessário avançar na reforma agrária, mas também, fortalecendo a opção do crédito fundiário, porem, as condições de aquisição de terra devem ser mais favoráveis do que é atualmente, de modo que os jovens tenham facilidades e não dificuldades. Estas facilidades passam pelas condições de pagamento das parcelas, o que não deve ser tornar pesado demais, mas sim adequadas à renda gerada.

O crédito fundiário Programa Nossa Primeira Terra deve ser simplificado, ágil, desburocratizado, sem juros, com tetos maiores, estimulando a aquisição de terra, preferencialmente na mesma região de origem no jovem e podendo ser adquirida entre pais e irmãos. Os governos federal e estadual, devem criar formas de acesso à terra em boas condições para a juventude. Uma possibilidade, por exemplo, seria a aquisição de grandes áreas de terras divididas por grupo de jovens, onde a infraestrutura seria facilitada e garantida pelo Estado.

Outra proposta é a criação do Pronaf Sucessão, uma política abrangente o acesso à aquisição da terra de forma facilitada e subsidiada, articulada com a política de habitação e o primeiro crédito para produção e geração de renda. Para ser uma política justa deveria estar indexada ao preço dos produtos agrícolas de modo a criar as condições para o jovem não se endividar no caso de crises se preços. A facilitação do crédito para habitação é uma política que motiva a permanência no meio rural e deve ser facilitada pelo Estado, um bom subsídio é estimulante ao jovem.

Associado a aquisição da terra, a habitação está a infraestrutura do meio rural, de estradas em boas condições para o escoamento da produção, distribuição de água, recolhimento de lixo, transporte público, sinal de telefonia, internet, assistência a saúde e educação. A pessoa que reside no meio rural tem os mesmos direitos que os demais, inclusive, pelas condições em que vive deve ter algumas prioridades e facilidades, e o poder público deve responder a isso com eficiência.

4.3 POLÍTICA AGRÍCOLA E GERAÇÃO DE RENDA

A existência de políticas de geração de renda é estratégica para a juventude ser estimulada a permanecer e produzir de forma estabilizada. É preciso políticas tanto para o jovem que mora com a família como aquele que quer construir uma unidade produtiva própria.

O crédito especial para a juventude, desburocratizado e em condições favoráveis, é um facilitador por proporcionar os investimentos necessários, porem é preciso mais ações governamentais, de preferência articuladas entre si, de forma a se complementarem e maximizarem os esforços. Precisa-se de políticas para alem do crédito.

Para a viabilidade econômica da juventude da agricultura familiar é necessário estimular a organizar da produção, se construindo e se fortalecendo as cooperativas, as associações, os grupos de cooperação.

Atualmente existem políticas públicas importantes, que poderiam ter categorias especiais – valorizando de alguma forma, inclusive com preço melhor - para estimular a juventude, como por exemplo, os de comercialização e acesso ao mercado institucional pelos Programas de Aquisição de Alimentos (PAA) e no Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Essas políticas estimulam e podem estar articuladas com outras como ponto de distribuição dos produtos produzidos pela agricultura familiar, centrais de comercialização e feiras de venda direta aos consumidores. A comercialização é um aspecto que limita o desenvolvimento da agricultura familiar, portanto deve estar na prioridade dos governos, que podem contribuir no âmbito municipal, estadual e federal para criar facilidades de acesso ao mercado formal e a mercados alternativos.

Os tempos atuais são desafiadores para a agricultura familiar, por isso a presença pesquisa agrícola nas comunidades, juntamente com a assistência técnica são fundamentais, para a capacitação da juventude, a partir de suas demandas e necessidades locais, podendo ser feitos pesquisas aplicadas nas propriedades com a colaboração da juventude, inclusive com bolsas de apoio. A pesquisa e a assistência técnica podem contribuir de forma decisiva para serem construídos sistemas produtivos diversificados e ecológicos, distanciando os jovens dos agrotóxicos e dos riscos a saúde.

Como parte da estratégia da agricultura familiar e da FETRAF-SUL estão às agroindústrias. Para a juventude que esteja preparada, capacitada e consciente dos investimentos a assumir é importante ter estímulos e apoio para criação ou ampliação de agroindústrias, pois é umas das formas de agregar valor a produção, diversificar e estimular a participação das mulheres. Para isso a pesquisa pode contribuir também com novos produtos, sabores, conservação, qualidade, etc. Da mesma forma a extensão rural pode contribuir com a capacitação na gestão, no planejamento e organização da produção, etc.

A agricultura sofre devido às oscilações de preços que atrapalham a vida, o planejamento e põe em risco a continuidade da existência das propriedades rurais. Faz-se necessário criarem-se mecanismos de garantia de preço que proteja a produção da agricultura familiar do acaso do mercado. Estes mecanismos, que podem ser vários, que se complementem e se articulem, ajudarão na manutenção das propriedades, porque sem estímulos e correndo constantes riscos e prejuízos a juventude não se sente estimulada a permanecer no meio rural.

4.4 EDUCAÇÃO

A educação tem sido um fator de exclusão de pessoas do campo, principalmente da juventude, que sai para estudar e buscar alternativas de trabalho e acaba ficando. Isso acontece, em muitas vezes, porque a escola não possibilitou a reflexão sobre a vida concreta nem ofereceu alternativas. A educação para o rural nunca foi apropriada ao meio, perdendo a possibilidade de dialogar com a distintas realidades sociais, geográficas e culturais. Para se pensar uma educação adequada um conjunto de fatores devem ser considerados, a começar pelas escolas que existem e precisam de mudanças na grade curricular para que possam entender o meio e contribuir para a melhoria da vida das pessoas e não ser um veículo que estimule o êxodo rural, mas pelo contrário que estimule a permanência das pessoas e a valorização do espaço rural, das comunidades e dos pequenos municípios. É preciso a integração das disciplinas e a vinculação destas com a realidade social, econômica e cultural das pessoas e das suas regiões. A escola e a educação das crianças e dos jovens devem ser voltada à realidade aos jovens do meio rural e as disciplinas e matérias devem refletir isso, mostrar, problematizar e ter como base a realidade da agricultura familiar. Seus problemas, dificuldades e desafios, sistemas de produção e dos outras etapas da cadeia produtiva. Para isso se faz necessário a formação continuada dos professores voltada para educação no campo.

Isso não significa isolamento, muito pelo contrário, cada vez mais as pessoas estarão conectadas ao mundo e isso é importante, mas a escola deve partir da realidade local, valorizando e estimulando aos jovens pensá-la e transformá-la, no que for necessário. A juventude deve ficar no campo estando conectada ao mundo pela internet e outras formas de comunicação. Morar e trabalhar no meio rural por opção e porque encontra as condições para construir a sua vida no lugar.

A educação voltada a realidade do campo deve incluir a formação profissional, na modalidade que possibilite aos jovens estudarem em uma etapa e retornarem para conviver nas suas comunidades em outra etapa, reforçando o vínculo da educação e do jovem com a sua família e sua realidade. O Ensino de Jovens e Adultos deve criar formas de ser acessível às pessoas de todas as idades, proporcionando oportunidades para os jovens que não cursaram regularmente a escola, o exemplo é o Programa Terra Solidária, que possibilitou a muitos retornarem aos estudos e obterem o certificado. O Programa Terra Solidária é uma referência como proposta metodológica para se fazer a educação adequada ao meio rural.

É necessário ampliar as escolas profissionalizantes federais ou escolas e cursos técnicos mantidos com convênios federais direcionadas para filhos de agricultores familiares. Porem as organizações devem ajudar a debater e a construir a metodologia do ensino para que ele possa realmente contribuir com a agricultura familiar. Somado a isso as universidades federais devem abrir cursos com grade curricular e pedagogia que contemple as necessidades e a realidade da agricultura familiar. A Universidade Federal da Fronteira Sul, especialmente, por estar em uma região onde predomina a agricultura familiar, deve criar cursos voltados à realidade da juventude da agricultura familiar, ao mesmo tempo criar cursos e programas de extensão para temas e áreas importantes que vão ajudar as propriedades familiares, como por exemplo na gestão, na produção ecológica, na agregação de valor aos produtos, dentre tantos outros. O governo federal tem o ProUni que dá cesso à universidade com bolsas de estudos, deveria ser criado convênios específicos para dar acesso à juventude do campo, em cursos que interessem a agricultura familiar, como por exemplo, o curso de veterinária, criado recentemente na UFPel para jovens assentados, inclusive com metologia adequada para favorecer o contato dos jovens assentados com suas origens.

Os estados e os municípios, articulados com o governo federal, devem apoiar a juventude criando as condições de infraestrutura, funcionamento e acesso às escolas, garantindo o transporte para ensino médio em todos os turnos, a existência de laboratórios de informática com internet e monitores para ajudar na capacitação e melhorar e potencializar o uso dessas ferramentas, bem como polos de cultura nas comunidades, com bibliotecas equipadas e estimulo a leitura, salas de cinema, jogos, quadras esportivas, entre outros, mantendo a escola aberta para o lazer e uso social e cultural dos jovens e das suas comunidades. Criação de

A escola é espaço de formação e exercício da cidadania e da democracia, portanto, deve ser estimulada a participação no planejamento e gestão da escola. A escola deve apoiar os jovens na participação de encontros e cursos extracurriculares, bem como a criação dos centros e grêmios estudantis pois são espaços políticos que formam a cidadania dos jovens despertando-os para os espaços públicos e para a coletividade.

4.5 CULTURA E INCLUSÃO DIGITAL

O espaço rural deve ser pensado a partir de suas especificidades mas como um sistema aberto e cada vez mais conectado ao mundo. Pensar a cultura, naturalmente, é ter a dimensão do todo e o reconhecimento da história, o respeito ao passado e das tradições, mas também é se abrir ao diferente e construir o novo. Assim, no mundo moderno é impossível pensar as relações humanas sem considerar a internet e os seus impactos - sejam positivos ou negativos - na vida das pessoas, no rural e no urbano. Faz-se necessário então promover a inclusão digital, que deve ser disponibilizado nas escolas, nos espaços comunitários, e em todas as propriedades da familiares. Uma inclusão digital se faz garantindo a facilidade de aquisição de computadores, capacitando os usuários para operar, e oferecendo um serviço de conexão de qualidade a custos baixos, nos casos coletivos e espaços públicos, serem gratuitos.

O espaço rural e sua cultura, devem ser respeitados e valorizados. O Estado deve assumir a promoção da valorização das comunidades rurais buscando superar superar a ideia equivocada de que o rural é um espaço atrasado. O meio rural oferece as pessoas muitas coisas que não tem nos centros urbanos, como ar puro, sensação de liberdade e de segurança, uma vida com menos estresse. Se o rural tem seus problemas, a cidade, igualmente, tem os seus, que não são poucos e não são fáceis de serem resolvidos. O que há são visões ideológicas que passam a ser verdades, e julgamentos do que é bom e do que é ruim. Na cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, milhares de pessoas que moram nas comunidades ou nos bairros, e passa uma vida e quase nunca tem a oportunidade de ir ao mar, somente olham de longe ou pela televisão, mas se passa a ideia de a todos se beneficiam pela proximidade do mar, o que não é verdade, isso ocorre em muitos outros casos em que os centros urbanos oferecem coisas que a maioria da população não tem acesso.

Para tornar a vida no rural mais atrativa e prazerosa, valorizando a propriedade e fazendo o embelezamento da moradia, promovendo a autoestima a dignidade próprio de quem sente bem onde mora. É preciso levar o lazer para o meio rural, criar projetos de entretenimento de acordo as demandas e necessidades locais, e isso acontece com a participação social. As atividades rurais não agrícolas, como o turismo rural, a gastronomia, turismo de aventura, turismo cultural, são elementos importantes de uma estratégia de valorização do rural e de geração de trabalho e renda, bem como a integração entre grupos de jovens de realidades diferentes é importante para construir-se identidades e trocas culturais.

4.6 VIDA RURAL E MEIO AMBIENTE

É preciso aproximar a agricultura do meio ambiente, se conscientizando e adotando técnicas eficientes de produção agrícola com preservação. A mudança de atitude em relação ao uso de agrotóxico, ao tratamento e destino adequado de resíduo, separação e reciclagem do lixo, cuidados e manejo sustentável da floresta, da água e dos solos.

Torna-se, cada vez mais, evidente que um novo modelo agrícola deve ser construído porque a agricultura como está é insustentável, trouxe riscos e graves impactos ambientais e sociais. Para se construir outro modelo agrícola é necessário iniciar por valorizar as culturas tradicionais, a diversificação produtiva, as sementes crioulas, a cooperação entre as famílias, assumir o cuidado de preservar e recuperar nascentes e as matas, colocando valores humanos e respeito ao meio ambiente sobrepostos ao lucro imediato e ao individualismo.

Os governos devem criar incentivos financeiros para os agricultores familiares que preservam o meio ambiente e para aquele que querem recuperar áreas degradadas ou fazer conversão para agricultura ecológica. A aprovação da lei de pagamento por serviços ambientais é importante para que os agricultores ao ter áreas de produção reduzidas não sejam penalizados, da mesma forma um programa de estimulo à agroecologia contribuirá para impulsionar a conversão de propriedades para sistemas mais harmoniosos com o meio ambiente.

Além disso, deve-se estimular a preservação espontânea, através da conscientização, principalmente, das crianças e dos jovens que vão habitar o meio e dali retirar o seu sustento e o seu futuro. Para isso deve se criar cursos de qualificação voltados para a educação ambiental, desenvolvimento sustentável e agroecologia, seja nas escolas regulares, seja em cursos de capacitação, de extensão ou acadêmicos, com convênios com universidades, órgãos de pesquisa, órgãos de governos, ou ONGs.

O mundo rural é conhecido como espaço de valores humanos, da solidariedade, da segurança, da paz, da integração com o meio ambiente, aspectos que está cada vez mais são e serão valorizados, no mundo todo. Faz-se necessário lutar para que políticas públicas sejam reforçadas, aperfeiçoadas ou criadas que vão consolidar e criar as condições de geração de renda e de vida digna, fazendo do rural um ótimo local para viver e trabalhar.

Isso passa, necessariamente, por uma disputa cultural com os que insistem em desfigurar e desvalorizar do meio rural. A organização e a intervenção da juventude da agricultura familiar é fundamental para alterar essa conjuntura e criar perspectivas melhores para os que habitam o rural e sabem do quanto é bom viver em lugares assim. O espaço da agricultura familiar, que alimenta a nação, pode ser também um espaço de cultura, de lazer, de atividades e de serviços não agrícolas, podendo receber visitantes que desejem usufruir e interagir com o meio ambiente, gerando renda para as famílias que moram ali.

5. QUEREMOS IR À LUTA

Somos, a juventude da FETRAF-SUL/CUT, nos orgulhamos de pertencer à agricultura familiar, de morar no meio rural, da nossa cultura e dos nossos símbolos. Nos orgulhamos de lutar por nossos direitos, por por políticas públicas que consideramos importantes, pelo que acreditamos, por um mundo melhor para nós, para nosso povo, para todos e para os que virão depois de nós, pois saberão, que tornamos realidade o refrão do hino nacional brasileiro: "verás que um filho teu não foge à luta".

Boa luta, juventude da agricultura familiar!


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