Mais de 160 pessoas participaram esta semana do seminário "Privatização da Biodiversidade e Violação de Direitos: transgênicos e propriedade intelectual", realizado durante o Fórum Social Mundial, em Belém. Dividido em dois turnos, o evento foi organizado por entidades e redes ligadas à Articulação Nacional de Agroecologia.Vinod Raina, da Fundação de Pesquisa para Ciência, Tecnologia e Ecologia (fundada e dirigida por Vandana Shiva), apresentou a forma como os camponeses estão se organizando em diferentes partes da Índia para preservar suas sementes e sua soberania alimentar. Em encontros comunitários, assumem compromissos coletivos nesse sentido, entre eles o de não usar agrotóxicos nem transgênicos, e não consumir Pepsi nem Coca-Cola.Silvia Ribeiro, do Grupo ETC do México, fez uma exposição acerca do crescente processo de concentração corporativa na área de sementes. As fusões entre indústrias também representam convergência de tecnologias, como no caso da biotecnologia com melhoramento genético de cana visando a produção e agrocombustíveis (ex., Monsanto e Allelyx), e na fronteira da biologia sintética para a produção de etanol a partir de microrganismos transgênicos construídos em laboratório a partir da junção de diferentes materiais genéticos, naturais ou sintéticos. Importante dizer que este tipo de tecnologia e suas aplicações estão completamente descobertos de qualquer tipo de regulamento ou legislação.Leonardo Melgarejo, representante do MDA na CTNBio, descreveu o funcionamento da Comissão e fez uma análise a respeito da dinâmica lá constituída, em que as decisões são tomadas previamente à análise propriamente dita de cada um dos pedidos de liberação comercial ou experimental de transgênicos.A última exposição dessa primeira sessão do seminário foi feita por Rubens Nodari, professor da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), que apresentou uma crítica às normas de "coexistência" para o milho aprovadas pela CTNBio. A norma, na verdade, se limita a estabelecer distâncias mínimas, irrisórias, de isolamento entre o milho transgênico e os demais, mas não esclarece se ela deve ser cumprida por quem planta transgênicos ou por seus vizinhos que não querem a contaminação.Na tarde seguinte, no segundo turno do Seminário, Camila Moreno, da Terra de Direitos, e Álvaro Carrara, do Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas, apresentaram estudos de caso sobre os impactos do avanço do agronegócio no Pampa e no Cerrado, respectivamente. Em ambos os casos ficou bem evidente que as monoculturas, sejam elas de cana, soja ou eucalipto, estão transformando as paisagens desses biomas e promovendo um acelerado processo de destruição da biodiversidade, perda da cultura local e concentração fundiária e de acesso aos recursos naturais.No caso do Cerrado, as populações locais do Norte de Minas, diante da inação do Estado, estão recuperando suas terras, hoje convertidas em monoculturas de árvores, através de demarcações que elas próprias fazem e que são seguidas de (re)ocupações das áreas.Gilles Ferment, pesquisador do Nead (Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento / Ministério do Desenvolvimento Agrário), apresentou os resultados de um estudo sobre a contaminação da soja no Rio Grande do Sul e evidenciou que apesar de a planta ser auto-fecundada, a contaminação ocorre e de forma massiva em outras etapas da cadeia produtiva. A última exposição foi de Verónica Villa, do Grupo ETC do México, que abordou o problema da contaminação do milho crioulo no país e o trabalho realizado pela Red en Defensa Del Maíz.Desde o início dos trabalhos e encontros de camponeses e assessores ligados à rede, o grupo evoluiu para o conceito de "cultivos soberanos", entendendo que um povo que não tem diversidade é um povo que se faz dependente, e que um povo que compra comida é um povo que não pode governar a si mesmo.Os indígenas mexicanos, Pueblo Del Maíz, entendem que o milho contaminado é um milho doente, que precisa ser tratado e curado, e para isso estão trabalhando para limpar suas variedades locais. A avaliação da rede é que a contaminação foi arquitetada para aniquilar a possibilidade de soberania e autonomia dos camponeses, entendendo que se as sementes forem perdidas, perdem-se também os saberes.Nos momentos de debate foram resgatadas algumas propostas resultantes do seminário sobre transgênicos realizado em Porto Alegre durante o FSM de 2005, como exigir audiências públicas para debater a liberação dos transgênicos, ampliar a participação e transparência dos processos de tomada de decisão, inclusive com acesso aos documentos, e solicitar maior ação do Ministério Público Federal sobre o tema. São medidas que foram implementadas nesses quatro anos transcorridos entre o Fórum de Porto Alegre e o de Belém e que se mostraram importantes.No mais, os participantes levantaram a necessidade de fortalecer e ampliar a luta contra os transgênicos, desencadeando ações descentralizadas e valorizando experiências locais de conservação e uso da biodiversidade e de formas sustentáveis de produção de alimentos.
Fonte: Campanha por um Brasil Livre de Transgênicos.
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