sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Fumo: Produção aumenta, consumo estabiliza, exportações recuam, dólar desvaloriza e as fumageiras continuam explorando os agricultores

Fonte: Deser

Produção mundial continua aumentando e deve ser maior em 2010/11

Não há números oficiais referentes à totalização da safra mundial de fumo em 2010/11, uma vez que o USDA não mais publica informes de conjuntura para a safra mundial de tabaco, e a FAO limita-se a fazê-lo somente após o término de cada safra. Entretanto, o que se observa nos principais produtores mundiais de fumo é a continuidade do crescimento verificado nas últimas safras. De acordo com a FAO, a safra mundial de fumo em folha atingiu, em 2008/09, cerca de 6,88 milhões de toneladas, volume superior ao obtido em 2007/08, que foi de 6,2 milhões, e ainda mais superior às 6 milhões de toneladas do início do ano 2000.

Durante esse período houve uma reestruturação na produção mundial do produto, cujo crescimento deixou de ser impulsionado por países produtores tradicionais, como os EUA e o Zimbábwe, para concentrar-se na China, Brasil, Indonésia, Malawi e Paquistão, entre outros. Ou seja, foram estes países os principias responsáveis pelo aumento verificado na produção na década de 2000.

De acordo com as notícias veiculadas pela imprensa, a produção mundial deve continuar crescendo em 2010/11. Isto porque crescem as produções, na Ásia, nos países africanos, nos EUA e no Brasil. Nestas condições, é possível que a oferta total de fumo em folha oriunda unicamente desta safra ultrapasse 7 milhões de toneladas, volume que poderia ser considerado, assim, como histórico para a cadeia do fumo em nível mundial.

Evolução de produção mundial de fumo em folha

Ano

Produção

Var.(%) Anual

2000

6.582.340

-

2001

6.111.220

(7,16)

2002

6.555.690

7,27

2003

6.500.140

(0,85)

2004

6.961.220

7,09

2005

7.022.370

0,88

2006

6.937.080

(1,21)

2007

6.424.090

(7,39)

2008

6.348.020

(1,18)

2009

6.904.210

8,76

2010*

7.000.000

1,39

Fonte: ITGA (Associação Internacional dos produtores de Tabaco). *Estimativa.

Produção brasileira maior

Assim como em outros países, no Brasil, a produção de fumo em folha também deve aumentar em 2010/11. De acordo com a Afubra, a produção brasileira de fumo em folha deve chegar, na safra que está sendo colhida a 747,89 mil toneladas, 3% acima do volume colhido na safra anterior. Apesar de haver redução nos estados do Paraná e Santa Catarina, o aumento superior a 12% no Rio Grande do Sul deve garantir a obtenção de safra maior.

Produção brasileira e estadual de fumo em folha (em mil t) – Comparativo 2009/10 e 2010/11

Estado

2009/10

2010/11

Var. %

Paraná

132,13

124,48

-5,79

Sta. Catarina

241,96

232,19

-4,04

R. G. do Sul

317,78

357,15

12,39

Outros

34,18

34,07

-0,32

Total

726,05

747,89

3,01

Fonte: Afubra.

Na realidade, o aumento da produção neste ano deve se dar por conta da recuperação da produtividade no Rio Grande do Sul após as perdas verificadas naquele estado na safra 2009/10, em decorrência do excesso de chuvas no período da colheita. Isto porque a área plantada com fumo no país vem recuando nas últimas safras em virtude das indústrias darem preferência a agricultores mais consolidados, que podem cultivar maiores áreas, e conseqüentemente alcançar maior produção. Como se pode observar no quadro abaixo, verifica-se que a área cultivada com fumo no Brasil em 2010/11 seja de 393,78 mil hectares, quase 3% abaixo da área verificada na safra passada.

Área plantada com fumo no Brasil (em há) – Comparativo 2009/10 e 2010/11

Estado

2009/10

2010/11

Var. %

Paraná

65,27

63,78

-2,28

Sta. Catarina

124,63

118,54

-4,89

R. G. do Sul

180,93

177,31

-2,00

Outros

34,28

34,15

-0,38

Total

405,11

393,78

-2,80

Fonte: Afubra.

Isto também demonstra a realidade da fumicultura no Brasil, em especial quando lembrado que esta se dá, principalmente em estabelecimentos familiares. Em 2010/11, o número de estabelecimentos produtores de fumo no Brasil deve ser um pouco menor que os dois anos anteriores, 221,33 mil, contra 222,11 em 2008/09 e 223,64 mil na safra 2008/09, conforme pode-se observar na tabela abaixo.

Fumo: número de estabelecimentos produtores no Brasil – 2006/07 a 2010/11 (em mil unidades)

Estado

2006/07

2007/08

2008/09

2009/10

2010/11

Paraná

34,49

34,11

33,02

35,21

35,08

Sta. Catarina

56,45

55,12

58,15

55,17

54,86

R. G. do Sul

91,71

91,29

95,41

94,78

94,37

Outros

37,24

36,85

37,06

36,95

37,02

Total

219,89

217,37

223,64

222,11

221,33

Fonte: Afubra.

Assim, verifica-se que a produção brasileira de fumo, após ultrapassar as 800 mil toneladas na safra 2006/07, vem recuando nos últimos anos. De toda forma, a recuperação da produção no Rio Grande do Sul, cujas lavouras neste ano não sofreram graves problemas em virtude de fenômenos climáticos, deve fazer a produção total aumentar em relação à safra passada.

Exportações menores

Ao lado de uma produção maior no Brasil e no mundo, outro fator a interferir sobre os preços no mercado interno, influenciando diretamente naqueles recebidos pelos agricultores, refere-se ao nível das exportações. Isto decorre do fato de o Brasil ter se tornado, principalmente após a Lei Kandir, (que desonerou os impostos sobre exportações de produtos básicos e semi-elaborados dentre os quais estão os produtos agrícolas), o principal exportador mundial de fumo em folha, sendo este na realidade o principal objetivo da produção de fumo no Brasil. Como regra geral, pode-se dizer que 85% da safra brasileira é exportada em forma de folha para o mercado mundial. Assim, num ano em que sobra produto no mercado interno em decorrência de problemas para as exportações, a tendência é de preços menores aos agricultores em virtude da pressão exercida pelas empresas.

Ocorre que neste ano parece ser exatamente isto que está havendo. De acordo com o MDIC/SECEX, em 2010 as exportações totais de fumo (somando fumo em folha e os diversos tipos de cigarros) chegaram a 493 mil toneladas, volume aproximadamente 25% inferior ao volume exportado em 2009, que foi superior a 661,73 mil toneladas.

Em relação ao fumo em folha, o recuo também foi significativo, com uma exportação de somente 384,39 mil toneladas, 24% abaixo do volume exportado em 2009.

Brasil: exportações de fumo em valor e volume – 2008 a 2010

Fumo Total

Ano

US$ FOB

Peso Líquido(Kg)

Preço (US$/Kg)

2008

2.683.203.506

677.877.016

3,96

2009

2.991.818.226

661.738.311

4,52

2010

2.706.731.951

493.007.816

5,49

Fumo em Folha

Ano

US$ FOB

Peso Líquido(Kg)

Preço (US$/Kg)

2008

2.558.468.650

495.763.078

5,16

2009

2.861.936.027

507.568.536

5,64

2010

2.585.008.070

384.393.291

6,72

Fonte: Sistema Alice/Secex.

Dólar desvalorizado traz perda de competitividade do fumo exportado

Constata-se uma queda nas exportações brasileiras nos últimos anos. Neste ano, em virtude do aumento da produção mundial e do consumo que não aumenta muito, estando atualmente muito atrelada ao crescimento da demanda na Ásia, as exportações de fumo brasileiro devem apresentar dificuldades para voltar a atingir os volumes acima das 600 mil toneladas anuais.

Para além destas razões, há de se lembrar que nos últimos anos, a tendência à manutenção de taxas de juros muito elevadas quando comparadas com outros países, aliado ao fato de que o país não usa mais dólar para pagar importações de petróleo e, principalmente a partir de 2008, com a crise do capital mundial que, trazendo poucas oportunidades de aplicação do capital em outros locais no mundo, tem favorecido a entrada cada vez maior de dólar no mercado brasileiro. Assim, o excesso de dólar no mercado interno tem trazido a desvalorização da moeda norte-americana. Atualmente, essa moeda está cotada a R$ 1,66, valor 11% inferior ao valor do final de janeiro de 2010. Se comparada com dois anos atrás, a desvalorização chega a mais de 28%.

Brasil: preço do dólar comercial no último dia útil de janeiro

Ano

Preço em Real

Var. (%)

2008

1,76

-

2009

2,31

31,25

2010

1,87

-19,04

2011

1,66

-11,22

Fonte: IPEA.

O problema deste fator é que isto reduz a competitividade do fumo exportado pelo Brasil, uma vez que encarece seu preço em dólar. Como visto anteriormente, o valor médio do fumo em folha exportado a partir do Brasil em 2010 foi de US$ 6,72/kg, contra US$ 5,64/kg em 2009, um aumento de preços de quase 20% num único ano.

A questão é que não há razão alguma para acreditar que o preço do dólar vá aumentar, pelo menos no curto e médio prazos. De um lado, continua a afluência de dólar na economia brasileira, adquirindo empresas brasileiras; de outro o início da exploração do petróleo no Pré-Sal somente aumentará o afluxo de dólar à economia brasileira, haja vista a exportação deste; e, por último, o enfrentamento à tendência ao aumento da inflação trará novos aumentos nos juros internos. Ou seja, a tendência à continuidade da desvalorização do dólar continuará a trazer problemas para a competitividade do fumo exportado a partir do Brasil neste ano. Com isto há forte tendência das empresas pressionarem para a manutenção dos baixos preços ou, no mínimo, efetuarem o pagamento com preços efetivos bem reduzidos aos agricultores.

Protocolo de preços: falta de unanimidade na assinatura de acordo

Na situação descrita acima, e como tem sido normal em outras épocas, as empresas estão tentando manter estável a sua taxa de lucro, repassando os custos aos produtores, o que significa pagar o menor preço possível para os agricultores. Isto se manifesta em dois momentos bem distintos: i) na definição de acordo para um preço que remunere, no mínimo, a variação dos custos que os agricultores tiveram que enfrentar nos últimos anos e ii) na efetivação, neste caso muito mais bem sucedida, de um significativo rebaixamento na classificação do fumo.

No primeiro caso, é interessante lembrar que os preços atuais para a tabela de preços referem-se à safra 2008/09, quando houve o último acordo de preços assinado entre os agricultores e a indústria fumageira. Naquele ano, o preço acordado para o TO2 era de R$ 5,68/kg ou R$ 85,20/arroba e, para o BO1 de R$ 7,07/kg ou R$ 106,05/arroba.

Na safra seguinte, ou seja, em 2009/10, não houve acordo de preços e não foi assinado o protocolo. Nesta oportunidade, as empresas fizeram reajustes nos preços que, segundo a Afubra, variaram de 6,1% a 10% para os agricultores que entregassem sua produção às indústrias, cumprindo, assim, o contrato assinado entre a empresa e o agricultor.

PREÇO DO TABACO – Reajustes sobre a tabela de 2008/09

Empresa

Var, %

BO1/KG

Alliance One

7,00

7,56

ATC

7,50

7,60

Brasfumo

6,00

7,49

CTA

7,50

7,60

Industrial Boettcher

7,50

7,60

Intab

7,00

7,56

J T I Kannenberg

10,00

7,78

Prêmium

7,50

7,60

Souza Cruz

8,00

7,64

Tabacos Marasca

6,10

7,50

Universal Leaf

7,50

7,60

Fonte: Afubra.

Deve-se notar, entretanto, que apesar das dificuldades nas exportações já notadas desde o ano passado, a safra 2009/10 apresentou um recuo significativo no volume produzido, atingindo na safra passada somente 726 mil toneladas, o que significou somente 691,87 mil toneladas de fumo manufaturado. Com isto, percebe-se que a indústria teve problemas para a obtenção dos volumes de fumo que então necessitavam para cumprir seus contratos. Por conta disso, as empresas se viram obrigadas a pagar um valor superior ao que até então estava em vigor.

Para esta safra, com a produção aumentando, dólar recuando e dificuldades de exportações, a política das empresas é, claramente, outra. Já no início da safra diziam que, como alguns insumos entregues aos agricultores estavam atrelados ao dólar e como este estava recuando, recuando o preço destes insumos, não havia razão alguma para aumento de preços na comercialização desta safra. Entretanto, com a divulgação dos índices de inflação de 2010, que ultrapassou os 5%, recuaram desta posição, mas continuaram com os entraves à assinatura de um acordo de preços.

Por conta disto, várias reuniões ocorreram entre as entidades que representam os produtores nas negociações e as indústrias, mas até o momento houve apenas um acordo parcial entre agricultores e indústrias. Os agricultores exigiam um aumento de 11,32% sobre os preços constantes na tabela de 2008/09, enquanto as empresas levaram mais de 2 meses para apresentar uma contra-proposta. A última reunião de negociação ocorreu no dia 31 de janeiro, em Florianópolis, e cinco empresas assinaram um acordo de preços aceitando pagar um reajuste de 10% sobre os preços da safra 2008/09. Neste caso, por exemplo, o preço do fumo Virgínia, BO1 passa a R$ 7,78/kg, ou R$ 116,7/arroba e TO2 passa a R$ 6,25/kg ou R$ 93,75/arroba. Já o fumo da variedade Burley, tipo B1, passa a R$ 6,85/kg ou R$ 102,75/arroba. As empresas que assinaram o acordo foram: Souza Cruz, Philip Morris, Kannenberg, CTA, Premium, ATC, Marasca


e Intab. No entanto, duas empresas presentes à negociação não assinaram o protocolo, a Universal Leaf e Alliance One.

Ocorre que a inflação, medida pelo IGP-DI/FGV, de 2008, quando foi plantada a safra 2008/09 até o momento ultrapassa os 11%. Assim, as empresas estarão repassando para os agricultores parte das perdas que poderiam ou podem vir a ter com o recuo nos preços externos.

Da mesma forma, de nada ou muita pouca coisa adianta as empresas aumentarem os preços, assinando um protocolo de intenções se fizerem uma classificação bem mais dura em termos de tipo e qualidade do fumo que está sendo entregue pelos agricultores. Ou seja, se as empresas quiserem (e geralmente elas o querem quando isto se faz necessário), a redução que teriam em seus lucros oriundo do aumento nos preços pagos aos agricultores é compensada por uma classificação mais exigente. Esta, por estar nas mãos das empresas, é geralmente realizada conforme suas necessidades e pode servir como meio para compensar o aumento nos preços. Como isto já tem sido feito, parece este ser o caminho que trilharão várias, para não dizer todas, na comercialização desta safra.

Finalmente, os agricultores familiares produtores de fumo e suas organizações de real representação, além da busca de enfrentamento ao problema dos baixos preços e da redução da classificação, deverão ficar atentos a um terceiro movimento que poderá ser adotado pelas empresas sempre atentas à garantia do seu lucro a qualquer custo. Trata-se de uma possível negativa de compra do fumo que ultrapassar a estimativa de produção de cada produtor.

Como se vê com toda a clareza, os agricultores sempre são usados pelas fumageiras, quando o objetivo é a avidez pelo lucro.

Divulgação: http://fetrafsul.org.br/